sexta-feira, 15 de julho de 2011

MOMENTOS 27



12 de Julho de 2011 ( fim de tarde )


Revitalizar as asas e o corpo e a vontade.

O Mundo continua à espera, continua a receber os bandos de peregrinos que migram de todas as paragens para receber como dádivas novas histórias.

Se as pétalas enfeitiçadas já não fazem parte do topo do imenso Kanchenjunga é porque abalei em direcção ao reino do Butão. Para lá migraram os primeiros grous com as histórias transmitidas pelo terceiro dos oito irmãos. Por lá se mantiveram as histórias com uma pureza ímpar, única, e só aos peregrinos que por essas paragens se aventurarem serão da mesma forma transmitidas.

Descer, voando veloz, escutando as aves e as florestas milenares, fazer parte do vento e das brisas que as penteiam.

Acompanhei a história até aqui. Os passos dados, as evidências recolhidas, os voos realizados e as montanhas conquistadas.

Ao ter desejado ser apenas rapaz-pássaro para livremente percorrer os caminhos, os céus, as paisagens, deixar-me ir ao sabor dos ventos e das nuvens, abracei a condição mais solitária da viagem. Passei a ser o peregrino que procura e não aquele que move os peregrinos. Passei a visitar as estrelas com paixão e com saudade.

Não posso afastar-me da influência da grande cordilheira. A imponência e majestade dos seus cumes, vales, veredas, a importância que possuem todas as histórias que nas suas pedras estão arquivadas fazem dos meus voos meros passeios em seu redor. Aqui estão guardados todos os inícios, aqui continua a crescer a mais alta de todas as montanhas, aqui se escutam as histórias, se transmitem de pais para filhos, de avós a netos, de peregrinos a outros fiéis, de professores a discípulos, e dos poetas à mais fiel das suas companheiras, as folhas virgens que darão à luz os seus poemas. Aqui se escutam os sons de todas as músicas e melodias. Aqui se vê mais longe e distante e daqui nos transportam as pedras sagradas por viagens inesquecíveis que nos levam às profundezas das galáxias, dos universos, deste universo e até ao primeiro. O amor existe algures nestas montanhas, como o vento sopra, espalha, vem ter connosco e nos transforma.

Recordo mais uma vez o teu sorriso de menina, a tua voz e o teu perfume. Os teus cabelos negros, os teus olhos negros profundos e sábios, os sabores do teu corpo, as melodias que acontecem quando nos unimos, as estrelas luminosas que brilham agora mais do que nunca por estarmos finalmente juntos na nossa morada lunar.

É tarde para nos desculparmos, para imaginarmos o que poderia ter acontecido se não me tivesses transformado em rio. Abalei feliz pelo céu transfigurado em firmamento, feliz por ter encontrado quem me protegesse, feliz por ter deixado de ser invisível, por ter descoberto o gosto pelas coisas belas da vida, feliz por existir vida para lá das amargas lixeiras de Allahabad, feliz por não ter morrido afogado tão novo nas águas sagradas do Ganges, feliz por me teres mostrado o lugar onde habitas, a mim e só a mim, minha amiga, meu amor.

A lua é o lugar onde vivemos, por um instante, para toda a eternidade, e a solidão deste momento da viagem trouxe-me a recordação dessa luminosa certeza.

Estou feliz porque fomos felizes no lado mais iluminado da lua.

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